“O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo seu Espírito que habita em nós, aleluia!” (cf. Rm 5,5;10,11).
Reza a tradição eclesial que a Vigília de Pentecostes é uma das celebrações mais especiais da nossa Igreja. Assim como na Vigília Pascal, realizava-se o batismo, unido à crisma. Se a noite pascal dava maior ênfase ao batismo – morrer e ressuscitar com Cristo –, o tema pentecostal refere-se, antes, ao dom do Espírito, relacionado à crisma. Por isso, esta vigília é uma oportunidade vivíssima e ideal para a crisma ou, ao menos, para um retiro com os jovens que, conscientemente, vão assumir a vida no Espírito Santo.
Caros irmãos,
O que é Pentecostes? Em Pentecostes, renovamos a cena do Cenáculo, idealmente ligado ao de Jerusalém, onde, há quase dois mil anos, ocorreu a primeira prodigiosa efusão do Espírito Santo sobre os Apóstolos e Maria Santíssima. Naquele dia, nasceu a Igreja una, santa, católica e apostólica: una, porque é tornada mistério de comunhão pelo Espírito, ícone da Santíssima Trindade na terra; santa, porque o Espírito conserva, em seus membros, a santidade de Cristo, Cabeça; católica, porque o Espírito a estimula a anunciar a todos os povos o único Evangelho da salvação; apostólica, porque, por meio do ministério dos Apóstolos e de seus sucessores, o Espírito a orienta pelas veredas da história.
Naquele tremendo dia, os Apóstolos receberam os dons do Espírito Santo. Jesus ressuscitado dissera aos discípulos: “Permanecei na cidade até serdes revestidos da força do Alto” (Lc 24,49). Isso aconteceu de forma sensível no Cenáculo, enquanto todos estavam reunidos em oração com Maria, Virgem Mãe. Como lemos nos Atos dos Apóstolos, repentinamente aquele lugar foi invadido por um vento impetuoso, e línguas como de fogo pairaram sobre cada um dos presentes. Então, os Apóstolos saíram e começaram a proclamar, em diversas línguas, que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, morto e ressuscitado (cf. At 2,1-4). O Espírito Santo, que com o Pai e o Filho criou o universo, guiou a história do povo de Israel e falou por meio dos profetas, que, na plenitude dos tempos, cooperou na nossa redenção, no Pentecostes desceu sobre a Igreja nascente, tornando-a missionária e enviando-a para anunciar a todos os povos a vitória do amor divino sobre o pecado e a morte.
O Espírito Santo é a alma da Igreja. Sem Ele, a que se reduziria ela? Sem dúvida, seria um grande movimento histórico, uma instituição social complexa e sólida, talvez uma espécie de agência humanitária. E, de fato, é assim que a veem aqueles que a consideram fora de uma perspectiva de fé. Na realidade, porém, em sua verdadeira natureza e também em sua mais autêntica presença histórica, a Igreja é incessantemente plasmada e orientada pelo Espírito do seu Senhor. É um corpo vivo, cuja vitalidade é precisamente fruto do invisível Espírito divino.
Queridos irmãos,
A Primeira Leitura da vigília desta noite, na qual escolhemos Gn 11, sobre a confusão das línguas por ocasião da construção de Babel, nos apresenta o que aconteceu no primeiro Pentecostes cristão, cinquenta dias depois da ressurreição de Cristo. Trata-se de uma “tipologia veterotestamentária” do Pentecostes cristão (cf. Gn 11,1-9). Dentro do coração do homem há um desejo de santidade que o leva a buscar o céu; por isso, seu anseio de perfeição o confunde em relação aos seus desejos terrenos. Por essa razão, o ser humano luta para alcançar poder, riqueza e conhecimento, tentando dominar o mundo e querendo ser outro deus.
Nesta narrativa simbólica, o autor nos mostra como arquitetam seus planos aqueles que se ajuntam para superar os desígnios de Deus. Os homens se unem para tentar a Deus! Em outras palavras, podemos perceber que o próprio homem foi o autor da confusão que há entre os relacionamentos sociais. Ninguém se entende; a unidade entre as nações é abalada por falta de entendimento e diálogo. Por isso as guerras, os combates, as mortes.
A torre de Babel é mencionada no livro do Gênesis como uma torre enorme construída pelos descendentes de Noé, com a finalidade de tocar os céus. Deus, irado com a ousadia humana, fez com que todos os trabalhadores da obra começassem a falar em idiomas diferentes, de modo que não conseguissem entender-se. Assim, abandonaram a construção e não conseguiram o seu intento. Foi nesse episódio que, segundo a Bíblia, se explica a origem dos idiomas na humanidade.
Também tentamos construir nossa própria torre para alcançar o céu quando, com nossas próprias mãos e sem medir as consequências, queremos construir algo que contraria as leis de Deus, querendo ser árbitros das nossas próprias ações. – Em que situação o homem continua tentando a Deus? – O que você pensa do homem ou da mulher que vive à revelia do projeto de Deus e se considera independente para fazer tudo segundo a própria vontade?
Prezados irmãos,
A Segunda Leitura (cf. Rm 8,22-27) nos apresenta as primícias do Espírito, que vem em socorro da nossa fraqueza. Somos salvos, mas ainda não se manifestou plenamente a nossa salvação. O que vemos é ainda fraqueza, pecado, morte, mas a Palavra de Deus nos revela nossa salvação, e o Espírito que recebemos é apoio para nossa fé, esperança e oração. Ele reza em nós, conhecendo melhor do que nós as nossas carências.
Por isso mesmo, o Salmo Responsorial (cf. Sl 104) canta a contínua “recriação” do universo pelo “Espírito de Deus”, princípio de vida divina na criação e na história, inspiração divina da vida, presença ativa de Deus em tudo o que acontece. Sem a participação de Deus, a criação nem sequer pode existir, e a história torna-se uma história de morte.
O Espírito de Deus não é alheio à matéria, mas serve para animar tanto a matéria biológica quanto a “matéria histórica” – a nossa sociedade. O oposto do espírito não é a matéria, mas a carne, isto é, a autossuficiência do homem. O espírito do amor de Deus deve transformar nossa história de “carnal” em “espiritual”. Neste texto, vemos como Paulo entende que a libertação do cosmos é consequência da libertação do homem. Embora ainda não vejamos claramente seus efeitos, aguardamos que se cumpram, assistidos pelo Espírito que vem em ajuda da nossa fraqueza.
São Paulo usa uma belíssima prosopopeia, propondo-nos a criação irracional a suspirar também pela restauração da ordem do mundo transtornado pelo pecado. À medida que os filhos de Deus santificam o mundo, todas as atividades terrenas também participam da glória dos filhos de Deus. De qualquer modo, o texto é de difícil interpretação, sobre a qual não há consenso entre os estudiosos.
“Possuímos as primícias do Espírito”, isto é, já possuímos o Espírito Santo, “mas sem que tenhamos ainda tudo o que essa posse desde já nos garante” (Pirot-Clamer). Embora já sejamos filhos adotivos de Deus (vv. 14-15), vivemos “esperando a adoção filial” em plenitude, o que acontecerá somente quando se verificar “a libertação do nosso corpo”, isto é, de tudo o que em nós é carnal, sujeito à corrupção e à morte (cf. 2Cor 5,1-5). “Gemidos inefáveis”: as íntimas moções da graça, as inspirações do Espírito Santo na alma, não se podem definir, nem sequer descrever.
Meus caros irmãos,
O Evangelho (cf. Jo 7,37-39) nos apresenta o lado aberto de Cristo, fonte do Espírito Santo. Na festa dos Tabernáculos, festa de luz e água, Jesus se revela como fonte de água viva. A água é força, Espírito de Deus. Elevado na cruz, Jesus derrama essa água de seu lado aberto. Quem acredita no Cristo exaltado recebe dele o Espírito e a comunhão da vida divina.
Todos nós podemos aliviar nossa sede com o Espírito que sai do lado aberto de Cristo, como as águas salvadoras saem do templo utópico de Ez 47. Enquanto Cristo não era glorificado, ainda não havia o Espírito. A glorificação de Jesus, na perspectiva de João, é sua exaltação na cruz, que é a glória de seu amor e fonte do Espírito que Ele nos dá. Celebramos, com Pentecostes, o dom do Espírito, que torna fecunda a glorificação de Cristo para os seus discípulos-missionários.
“Se alguém tem sede, venha ter comigo e beba. Aquele que crê em mim, como diz a Escritura, do seu interior brotarão rios de água viva”. Na primeira interpretação, trata-se do seio do Messias: do peito de Cristo, atravessado pela lança, vem-nos o Espírito Santo, como fruto maravilhoso da árvore da cruz. Na segunda interpretação, trata-se do seio do batizado, a alma do homem santificado por Cristo.
Prezados irmãos,
Queremos meditar sobre a Liturgia da Vigília de Pentecostes: toda a Igreja reunida para clamar o dom do alto, o dom do Espírito Santo, a grande promessa de Deus
para sua Igreja, para cada um de nós, para a nossa vida. “Sobre vós derramarei o meu Espírito”, afirma Jesus.
Aquilo que o Evangelho de João nos diz é o que, de fato, queremos clamar, porque temos sede – sede de Deus, sede de amor, sede de eternidade, sede de bondade. Há uma secura dentro de nós. E, muitas vezes, tentamos saciar essa sede com aquilo que não sacia, que não tira a nossa sede; muito pelo contrário, nos deixa ainda mais sedentos e vazios. Quantos se refugiam nos vícios, em coisas que não levam a nada, tentando saciar uma sede profunda que há na alma humana.
Jesus diz hoje a mim e a você: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37). Jesus é a fonte, Jesus é a água viva, Jesus é aquele que derrama sobre nós o Espírito Santo.
É Ele quem sacia a nossa alma com o Seu Espírito. Jesus é aquele que batiza no Espírito Santo. Foi Ele quem prometeu que o Espírito viria para estar conosco e conduzir nossa vida. Por isso, a Igreja se reúne em oração nesta Vigília, como Maria e os discípulos estavam reunidos no Cenáculo, clamando o Espírito do Senhor. E Ele veio! O Espírito veio sobre a Igreja e permanece com ela todos os dias. O Espírito está com a Igreja, permanece nela, porque é a alma da Igreja, é a força da Igreja. A Igreja não se conduz por homens, mas pelo Espírito que age em homens e mulheres de boa vontade.
Assim como o Espírito está na Igreja, Ele também quer estar em nossa vida. A Liturgia da Palavra desta vigília, repleta de textos que nos ajudam a compreender a ação e a promessa do Espírito, nos mostra o quanto o Espírito de Deus é necessário para dar vida a tudo. A terra era sem forma e vazia, e foi o Espírito que lhe deu vida e beleza. O povo de Deus era um povo em ruínas, desterrado, sem esperança, e foi o Espírito de Deus que restaurou suas forças e o reconduziu à sua terra. A humanidade era dispersa, perdida, como na torre de Babel, e foi o Espírito Santo que nos congregou como um só povo no dia de Pentecostes. A Igreja, impulsionada pelo Espírito, saiu do Cenáculo e foi evangelizar o mundo.
A nossa vida precisa do Espírito para encontrar sentido, direção e força. Por isso, clamemos juntos: Vem, Espírito Santo! Vem sobre a tua Igreja! Vem sobre cada um de nós! Vem, Espírito de Deus, renovar a face da Terra! Vem curar os nossos corações, transformar nossas feridas em cicatrizes de amor, transformar nossas dúvidas em fé viva, transformar nossos medos em coragem e firmeza de alma.
O Evangelho de hoje, que já lemos, é muito direto: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba.” O Espírito Santo é água viva. Jesus oferece ao sedento não apenas algo para beber, mas uma fonte a jorrar dentro de si mesmo. Receber o Espírito é tornar-se também fonte, ou seja, tornar-se alguém em quem a vida de Deus jorra para os outros, para o mundo.
É esse Espírito que transforma o caos em cosmos, a confusão em unidade, o medo em missão, a morte em vida. Ele é o mesmo Espírito que pairava sobre as águas
no princípio da criação, o mesmo que falou pelos profetas, o mesmo que desceu sobre Maria, o mesmo que ressuscitou Jesus dos mortos. E agora, Ele habita em nós!
Por isso, nesta vigília, somos chamados a abrir o coração. Não é simplesmente uma celebração ritual: é um clamor. Somos convidados a dizer: “Vem, Espírito de Deus! Enche o nosso coração, enche a nossa casa, enche a nossa comunidade. Enche este tempo tão árido e dividido com a tua paz, com a tua unidade, com a tua presença viva.”
O dom do Espírito Santo não é algo apenas individual. Ele nos faz Igreja, povo reunido. Ele constrói a comunhão. Ele dá dons diversos, mas todos para o bem comum. Ele distribui carismas e ministérios, mas todos para a edificação do corpo de Cristo. Por isso, devemos estar atentos: o Espírito que recebemos é para servir, amar, perdoar, reconciliar, consolar, curar.
Queridos irmãos,
Ao concluirmos esta Vigília, que o nosso coração esteja como o de Maria e dos Apóstolos no Cenáculo: aberto, orante, vigilante. Que a nossa oração se eleve como incenso diante de Deus. E que o Espírito Santo nos tome por inteiro, para que sejamos sinais vivos da presença de Cristo no mundo.
Que Pentecostes não seja apenas uma data no calendário litúrgico, mas um modo de viver, um estilo de vida marcado pela escuta, docilidade e ação do Espírito. Que sejamos cristãos pentecostais no mais profundo sentido: cheios do Espírito, impulsionados para a missão, corajosos no anúncio, perseverantes na oração, generosos no serviço, inflamados de amor.
Com Maria, a cheia do Espírito Santo, aprendamos a acolher, conservar e anunciar o dom recebido. Que ela nos ensine a dizer “sim” todos os dias à vontade do Pai, a nos deixarmos moldar pelo Filho e a sermos conduzidos pelo Espírito.
Vem, Espírito Santo! Enche os corações dos teus fiéis e acende neles o fogo do teu amor! Amém.
Padre Wagner Augusto Portugal.
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