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SÁBADO SANTO – VIGÍLIA PASCAL – C

 


Meus queridos Irmãos,

 

            Por venerável e antiguíssima tradição da Santa Igreja, esta é a “noite de vigília em honra do Senhor” (cf. Ex 12,42). Os fiéis, trazendo na mão – segundo o que nos ensina o Evangelho de Lc 12,35 e seguintes – a vela acessa, assemelham-se aos que esperam o Senhor ao voltar, para que, quando ele chegar, os encontre ainda vigilantes e os faça sentar-se à sua mesa.

            A noite santa da Páscoa é o grande sacramento da vida do cristão. O Batismo e a Eucaristia, que são o centro da liturgia desta venerável noite, tornam-se presentes e contemporâneos os acontecimentos que celebramos, e nos comunicam seu valor salvífico.

            A Vigília Pascal termina com a celebração eucarística que é a raiz de todas as outras; a partir desta noite da ressurreição, Cristo está presente entre os seus por meio dos sacramentos, e principalmente da Eucaristia que contêm todos os sacramentos.

            Comemoramos nesta venturosa noite a ressurreição de Cristo! Esta liturgia deve falar por si mesma: o mistério da nova luz que surge nas trevas, Cristo que venceu a morte e o pecado. Os fiéis se unem a este mistério, acendendo uma vela na chama do círio pascal, quando de sua entrada triunfal na Igreja: é a participação na vida ressuscitada do Senhor. Depois de entoarmos o “exultet”, seguem imediatamente as leituras do Antigo Testamento e as do Novo Testamento.

 

Irmãos e Irmãs,

 

            Nesta noite santíssima em que recordamos a ressurreição de Jesus, confirmando sua divindade e sua doutrina divina somos, criatura humanas, redimidos de todos os nossos pecados, e, sobretudo, da maior conseqüência do pecado, que é a morte eterna.

            Cristo morrendo, destruiu a morte. Ressurgindo, Cristo anuncia a vida integral, a vida nova, a vida eterna.

            Jesus Cristo ontem, hoje e sempre: dele são os tempos e a eternidade, a ele pertencem a glória e o poder! (cf Hb 13,8 e 1Pd 4,11).

            Cristo, de quem todas as coisas tomam vida, não podia ficar encerrado na Pedra. Ressuscitou para nos confirmar que é o Senhor da vida. Na Sexta-Feira Santa Ele deu a vida por nós, imolando-se no madeiro da Cruz. Hoje Jesus retoma a vida, para acordar em nós as sementes da imortalidade que todos trazemos, mas que eram chocas, porque lhes faltava a fecundidade divina. Com Jesus, nesta madrugada de Páscoa, nascemos para a vida eterna.

 

Caros irmãos,

 

O tema central da Vigília Pascal do ano C é “Testemunhar o Incrível”. No Evangelho – Lc 24,1-12 – “O Filho do Homem devia ressuscitar no terceiro dia”. São Lucas traz mais aparições pós-pascais do que os outros, e elas servem exatamente para que Jesus abra os olhos aos discípulos desanimados e incrédulos, explicando-lhes as Escrituras a seu respeito (Lc 24,27; Lc 24,45; At 1,3). Os mensageiros lembram às mulheres que Jesus predisse o cumprimento das Escrituras em sua paixão e morte. Mas quando elas voltam e narram isso aos discípulos, estes não acreditam (Lc 24,11). Apenas Pedro vai constatar o fato do sepulcro vazio – ele é a “escora” da fé de seus irmãos.

Os eventos pascais nos são transmitidos em duas categorias de testemunhos: o testemunho a respeito do sepulcro vazio e o das aparições. Este último é o mais antigo, o único que é mencionado na tradição de Paulo a respeito do querigma cristão (1Cor 15,3ss), primeira expressão escrita do evento pascal. O testemunho transmitido por Paulo corresponde essencialmente ao de Lc 24,13ss: as aparições de Jesus aos apóstolos e aos outros discípulos. Lucas narra o outro elemento, o sepulcro vazio – Evangelho – mui destacado por Marcos – de modo que prepare as aparições em que Jesus explicará o que as Escrituras disseram a seu respeito, tanto no que concerne à sua paixão e morte, quanto à sua ressurreição. O sepulcro vazio não fala por si. É um indício negativo, que precisa da complementação da Palavra, e esta consiste essencialmente no reconhecimento do plano de Deus – as escrituras – Jo 2,22; 12,16 – naquilo que aconteceu a Jesus.

Parece que as mulheres servem de intermediárias entre o sepulcro vazio e a explicação de seu sentido nas aparições de Jesus aos discípulos: elas devem lembrar-se, e recordar aos discípulos, que Jesus já anunciou estes fatos durante seu ensinamento na Galiléia – Mc 8,31 e Lc 9,22. O que ficará claro pelo ensinamento do Ressuscitado – o cumprimento das Escrituras na sua morte e ressurreição – ele mesmo já o ensinou, antes de sua morte. Jesus mesmo já tentou mostrar – mas não conseguiu – aos discípulos que qual era o caminho que ele deveria trilhar, o caminho do Servo Padecente, que será reerguido por Deus, depois de ter sido obediente – isto é – unido ao Pai – até a morte, assumindo o desamor aos homens. Este ensinamento é que o anjo lembra às mulheres e estas aos discípulos. Mas não é o suficiente para que eles cheguem à compreensão da fé.

 

Meus estimados Irmãos,

 

            A luz ressurgiu das trevas! Luz que significa salvação! Esta é a noite da salvação, trazida por Jesus de Nazaré, que, apesar de ter escondido sua divindade, declarou em alta voz no templo de Jerusalém: “Eu sou a luz do mundo e darei a quem me seguir a luz da vida!” (cf Jo 8,12). Com a gloriosa ressurreição os cristãos se tornam filhos da luz que nunca se apaga, que tremula eternamente!

            Abraão teve que decidir ou a fidelidade a Deus ou a seus interesses pessoais. E Abraão escolheu a fidelidade, mesmo diante do absurdo de sacrificar seu filho único. A leitura de Abraão obediente a Deus fez lembrar o dia em que Jesus parou à beira do poço de Jacó e disse aos Apóstolos: “O meu alimento é fazer a vontade do Pai” (cf Jo 4,34). E a vontade do Pai para com Jesus foi duríssima: que morresse na cruz pela salvação da humanidade. Mas Jesus ressuscitou por vontade de Deus. E por ter feito a vontade do Pai até o fim, Deus o glorificou. E dessa glória todos somos iluminados nessa noite santa.

 

Irmãos e Irmãs,

 

            A liturgia de hoje nos fala da escravidão e da maldade, dois dilemas da humanidade. Retomamos a passagem do mar vermelho e a saída dos hebreus da escravidão egípcia. A leitura do Êxodo nos relata que o mar se abriu e os israelitas passaram a pé enxuto. Ou seja, foram mais fortes do que os demônios e a maldade puderam atravessar seguros a casa de Satanás, vencendo todas as dificuldades físicas e espirituais, rumo à Terra Prometida.

            O homem, criado a semelhança de Deus, ora na fidelidade, ora na infidelidade, era incapaz de superar sozinho a condição de criatura pecadora e manchada pelo pecado. Foi, então, que Deus, que criara o ser humano por amor e no amor, novamente por amor veio em seu socorro, dando-lhe o próprio Filho como seu caminho, verdade, sua vida. Presente de Deus, ele nasceu na carne humana e entrou na nossa história; vivendo em tudo igual a nós, menos no pecado. Ele não apenas nos visitou, mas foi um de nós, carne de nossa carne e sangue de nosso sangue. Mas Filho de Deus. Foi o Filho de Deus que a maldade humana pregou numa Cruz, sexta-feira, e cujo o corpo as santas mulheres depuseram na sepultura. Deus o ressuscitou gloriosamente, para que nós pudéssemos andar em novidade de vida.

 

Prezados irmãos,

            Nesta noite santa gostaríamos de ressaltar três atitudes das mulheres: ver, escutar e anunciar!

            Primeiro As mulheres veem. O primeiro anúncio da Ressurreição é feito, não sob uma fórmula a decifrar, mas sob um sinal que se deve contemplar. Num cemitério, junto dum túmulo, onde tudo deveria estar em ordem e sossego, as mulheres “encontraram removida a pedra da porta do sepulcro e, entrando, não acharam o corpo do Senhor Jesus” (Lc 24, 2-3). Por outras palavras, a Páscoa começa invertendo os nossos esquemas. Chega com o dom duma esperança surpreendente. Mas não é fácil acolhê-la. Às vezes (temos de o admitir!) esta esperança não encontra espaço no nosso coração. Em nós, como nas mulheres do Evangelho, prevalecem interrogações e dúvidas, e a primeira reação face ao sinal imprevisto é o medo, é voltar “o rosto para o chão” (cf. 24, 4-5).

Em segundo lugar as mulheres escutam. Depois de terem visto o sepulcro vazio, dois homens em trajes resplandecentes disseram-lhes: “Porque buscais o Vivente entre os mortos? Não está aqui; ressuscitou!” (Lc 24, 5-6). Faz-nos bem ouvir e repetir estas palavras: não está aqui! Sempre que pretendemos ter entendido tudo acerca de Deus, podê-Lo arrumar nos nossos esquemas, repitamos a nós mesmos: não está aqui! Sempre que O procuramos apenas nas emoções, muitas vezes passageiras, ou nos momentos de necessidade, para depois O deixarmos de lado esquecendo-nos d’Ele nas situações quotidianas e nas opções concretas de cada dia, repitamos: não está aqui! E quando pensamos em confiná-Lo nas nossas palavras, nas nossas fórmulas e nas nossas tradições, mas esquecendo-nos de O procurar nos cantos mais escuros da vida onde há alguém que chora, que luta, sofre e espera, repitamos: não está aqui!

Em terceiro lugar as mulheres anunciam. Que anunciam elas? A alegria da Ressurreição. A Páscoa não acontece para consolar intimamente quem chora a morte de Jesus, mas para abrir de par em par os corações ao anúncio extraordinário da vitória de Deus sobre o mal e a morte. Por isso, a luz da Ressurreição não quer delongar as mulheres no êxtase dum gozo pessoal, não tolera comportamentos sedentários, mas gera discípulos missionários que “voltam do sepulcro” (Lc 24, 9) e levam a todos o Evangelho do Ressuscitado. Por isso mesmo, depois de ter visto e escutado, as mulheres correm a anunciar aos discípulos a alegria da Ressurreição. Sabem que poderiam ser tomadas por loucas – aliás o Evangelho diz que “as suas palavras pareceram-lhes um desvario” (Lc 24, 9) –, mas não estão preocupadas com a sua reputação, a defesa da sua imagem; não reprimem os sentimentos, nem medem as palavras. Apenas tinham o coração ardente para transmitir a notícia, o anúncio: “O Senhor ressuscitou!”

            Com as mulheres do Evangelho somos chamados a ver, escutar e anunciar que Jesus Cristo ressuscitou verdadeiramente aleluia, aleluia, aleluia!

 

Caros irmãos,

            O Papa Bento XVI assim nos ensinou: Este é o júbilo da Vigília Pascal: nós somos livres. Mediante a ressurreição de Jesus o amor revelou-se mais forte do que a morte, mais forte do que o mal. O amor O fez descer e, ao mesmo tempo, é a força pela qual Ele se eleva. A força através da qual nos leva consigo. Unidos ao seu amor, levados sobre as asas do amor, como pessoas que amam descemos juntos com Ele nas trevas do mundo, sabendo que precisamente assim também nos elevamos com Ele. Rezemos, portanto, nesta noite: Senhor, mostra hoje também que o amor é mais forte do que o ódio. Que é mais forte do que a morte. Desce também nas noites e na mansão dos mortos deste nosso tempo moderno e segura pela mão aqueles que esperam. Leva-os para a luz! Permanece também comigo nas minhas noites escuras e leva-me para fora! Ajuda-me, ajuda-nos a descer contigo na escuridão daqueles que estão à espera, que das profundezas gritam por ti! Ajuda-nos a levar-lhes a tua luz! Ajuda-nos a chegar ao «sim» do amor, que nos faz descer e por isso mesmo elevarmo-nos juntamente contigo! Amém”.

 

Meus irmãos,

Hoje é a maior coisa que se pode celebrar. Cristo ressuscitou. Deixemo-nos guiar pelas mulheres do Evangelho – Maria Madalena, Joana e Maria, a mãe de São Tiago, para descobrir com elas a aurora da luz de Deus que brilha nas trevas do mundo. Aquelas mulheres, enquanto a noite se dissipava e as primeiras luzes da aurora surgiam sem clamor, foram ao sepulcro para ungir o corpo de Jesus. E ali viveram uma experiência desconcertante: primeiro descobriram que o túmulo estava vazio; depois elas viram duas figuras com roupas resplandecentes, que lhes disseram que Jesus havia ressuscitado; e correram rapidamente para anunciar a notícia aos outros discípulos. Veem, escutam e anunciam. Com essas três ações também entramos na Páscoa do Senhor.

 

Caros irmãos,

            Deus, por intermédio da ressurreição de Cristo, fez conosco uma nova e eterna aliança nesta noite venturosa. O céu recebeu nesta noite todo o louvor possível na pessoa de Jesus, que cumpriu em plenitude à vontade de Deus e comprou com sua paixão e morte na cruz o direito de recriar as coisas e remarcar os rumos da criatura.

            Vamos viver como Cristo, como homens e mulheres da luz eterna, da salvação! Renovemos nosso compromisso de cristãos batizados e anunciemos a Ressurreição a todos os povos conclamando a todos para a missão, pois todos queremos nesta noite “VER JESUS, CAMINHO, VERDADE E VIDA PLENA!”

            Portanto deliciemo-nos das alegrias eternas com esta Santa Missa de Páscoa. Doce ação de graças por excelência, celebração da nova Páscoa de Cristo participada pela Igreja. A vida que nasce no Batismo e é animada pelo Espírito alimenta-se na mesa do Cordeiro pascal. Os cristãos devem dar testemunho da Morte e Ressurreição do Senhor Jesus e comprometer-se com a vida eterna, corpo dado e sangue derramado numa vida de ação de graças a Deus e ao próximo. Assim, inaugura-se um novo céu e uma nova terra.

            Jesus ressuscitou verdadeiramente! Aleluia! Aleluia! Aleluia!

            Santa, abençoada e Feliz Páscoa!

           

Padre Wagner Augusto Portugal.

 

 

 

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