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SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA – B

Conheça os motivos pelos quais a Igreja proclamou a Assunção de Nossa  Senhora“Grande sinal apareceu no céu: uma mulher que tem o sol por manto, a lua sob os pés e uma coroa de doze estrelas na cabeça.” (Ap 12, 1)

Neste domingo celebramos uma festa muito cara às tradições mineiras: a festa de Maria, quando ela é assumida, em corpo e alma, para o céu. Relembro de minha terra natal, a cidade de Boa Esperança, que nasceu sob a proteção do manto santo e abençoado da Virgem Dolorosa, a mater que soube, no silêncio de seu coração, guardar a vontade de Deus, dando o seu “Fiat” ao projeto da salvação de nossa pobre e pecadora humanidade.

A solenidade deste domingo é uma grande festividade de louvor a Maria Santíssima por parte dos fiéis, que vêem, ao mesmo tempo, a glória da Igreja e a prefiguração de sua própria glorificação. Festa grande, festa de solidariedade dos fiéis com aquela que é a primeira e a Mãe de todos os fiéis.

A leitura do Apocalipse, colocada como primeira leitura (Ap 11,19a;12,1.3-6a.10ab), é uma descrição original do povo de Deus, que deu à luz o Salvador e depois refugiou-se no deserto – a Igreja que foi perseguida e massacrada pelos romanos no primeiro século – até a vitória final de Nosso Senhor Jesus Cristo. O sinal da Mulher, no Apocalipse, aplica-se em primeiro lugar ao povo de Deus do qual nasce o Messias: a Igreja do Novo Testamento, nascida dos que seguem o Messias. Aparece no céu a Mulher que gera o Messias: as doze estrelas indicam quem ela é: o povo das doze tribos, Israel – não só o Israel antigo, do qual nasce Jesus, mas também no novo Israel, a Igreja, que, no século I. d.C., quando o livro foi escrito, precisa esconder-se da perseguição, até que, no fim glorioso, o Cristo se possa revelar em plenitude. Maria assunta ao céu sintetiza em si todas as qualidades desse povo prenhe de Deus, aguardando a revelação de sua glória.

Caros irmãos,

A segunda leitura (1Cor 15,20-27a) é, toda ela, escatológica, com gostinho de céu: a Assunção de Nossa Senhora ao céu é considerada como antecipação da ressurreição final dos fiéis, que serão ressuscitados em Cristo. Portanto, observe-se que a glória de Maria não a separa da humanidade, não a separa de cada um de nós, mas a une mais intimamente a nossa pobre humanidade.

A segunda leitura evoca a visão da vitória de Cristo sobre a morte. O sinal da vitória definitiva de Cristo é a ressurreição, seu triunfo sobre a morte. Essa vitória se realizou na sua própria morte e se realizará, também, na morte dos que o seguem. Maria já está associada a Jesus nessa vitória definitiva; nela, a humanidade redimida reconhece sua meta.

A Assunção é uma forma privilegiada de Ressurreição. Tem a sua origem na Páscoa de Jesus e manifesta a emergência de uma nova humanidade, em que Cristo é a cabeça, como novo Adão. Todo o capítulo 15 desta carta paulina é uma longa demonstração da ressurreição. Na passagem escolhida para a festa da Assunção, o apóstolo apresenta uma espécie de genealogia da ressurreição e uma ordem de prioridade na participação neste grande mistério. O primeiro é Jesus, que é o princípio de uma nova humanidade. Eis porque o apóstolo o designa como um novo Adão, mas que se distingue absolutamente do primeiro Adão; este tinha levado a humanidade à morte, ao passo que o novo Adão conduz aqueles que o seguem para a vida. O apóstolo não evoca Maria, mas se proclamamos esta leitura na Assunção, é porque reconhecemos o lugar eminente da Mãe de Deus no grande movimento da ressurreição.

Irmãos e irmãs,

Nossa Senhora foi a única criatura humana a receber esse grande benefício do Criador, a encarnação do Verbo. Isso porque, por obra e graça do Espírito Santo, coube a ela o serviço de receber a encarnação do Senhor, do Filho de Deus, predestinada desde sempre, isenta de todo o pecado desde a sua concepção imaculada, preservada de toda mancha do pecado original. Tornou-se, assim, a primeira criatura na fé cristã e a primeira a ser elevada à glória do céu em corpo e alma, graça inaudita alcançada pela Ressurreição de Jesus.

Maria é o modelo para todo cristão, de todos os fiéis; a primeira a alcançar o destino glorioso reservado a todos que crêem no Senhor Jesus. Maria a co-redentora, a santa, a luzeira dos cristãos. Maria, a esperança dos cristãos.

Caros irmãos,

O Evangelho (Lc 1,39-56) é o Magnificat. Maria vai ajudar sua parenta Isabel, grávida, no sexto mês. Ao dar as boas-vindas à prima, Isabel interpreta a admiração dos fiéis por aquilo que Deus operou em Maria. Esta responde, revelando sua percepção do mistério do agir divino: um agir de pura graça, que não se baseia em poder humano; ao contrário, envergonha esse poder, ao elevar e engrandecer o pequeno e humilhado que, porém, se dedica ao serviço de sua vontade amorosa. O amor de Deus se realiza não por meio da força, mas da humilde dedicação e doação. E nisso se manifesta sua grandeza e glória.

Em Maria são coroadas a fé e a disponibilidade de quem se torna servo da justiça e da bondade de Deus; impotente aos olhos do mundo, mas grande na obra que Deus realiza, personificada no triunfo e na humildade. O único meio para unir esses dois momentos é por tudo nas mãos de Deus, ou seja, esvaziar-se de toda glória pessoal, na fé em que Deus já começou a realizar a plenitude das promessas. Em Maria vislumbramos a combinação ideal da glória e da humildade: ela deixou Deus ser grande na sua vida.

Meus queridos irmãos,

Maria saiu de si mesma, renunciou a seus interesses para servir com exclusividade o mistério de Cristo. Ela desceu, durante a sua vida terrena, aos vales da humanidade pecadora, fazendo-se, como seu Filho, solidária com os irmãos, assumindo a condição de serva, humilhando-se em tudo. Depois, ela subiu com Ele a noite escura do Calvário, alcançou a manhã solar da Ressurreição, da Páscoa, da vida nova que nos foi inaugurada, cantando uma segunda vez o “Magnificat”, para agradecer a glorificação da humildade e da pequenez, a vitória sobre o pecado e a morte eterna, as grandes coisas operadas por Deus em benefício seu e da humanidade.

Se o “Magnificat” é o hino de agradecimento a Deus pela encarnação e pela obra redentora de Jesus Cristo, tudo o que Maria tem a agradecer a Deus o tem em função do mistério divino-humano de Jesus. Sua coroação como rainha do Céu e da terra é o coroamento de tudo o que ela cantou na casa de Isabel.

Assim, o “Magnificat” se desenvolve em quatro tempos: o primeiro, onde Maria agradece ao Senhor “a quem se deve à honra e a glória pelos séculos dos séculos”. Aqui é colocado a serviço como meta básica da vida cristã. Trabalhar com humildade para a dilatação do Reino de Deus. Humildade como virtude, humildade como meta cristã. A Virgem que recebeu, em Nazaré, o Filho de Deus hoje é elevada ao seio da Santíssima Trindade. O segundo tempo, onde a Virgem agradece as maravilhas operadas em todas as coisas, as maravilhas da história da nossa salvação, onde o Deus santo e eterno nos convoca para a santidade de vida e de estado. O terceiro tempo proclama a missa fundamental de Nosso Senhor: a ação de Deus em favor dos pobres e dos humildes, que tem a sua meta básica em Nossa Senhora que se despiu de tudo para servir e servir com alegria. Com o despojamento de Maria no seu sim, hoje elevada ao céu, leva consigo todos os pobres, filhos prediletos do Pai e comensais da casa divina.

O último tempo, em forma de louvor e de agradecimento, celebra a FIDELIDADE DE DEUS, o cumprimento de todas as promessas. Fidelidade a Deus e ao seu projeto de salvação, onde a humanidade se torna bom parceiro de Deus na história da salvação. Subindo aos Céus, Maria é considerada a primeira que teve acesso a esta fidelidade, que se transforma em comunhão perfeita e eterna com a Trindade Santíssima.

Caros irmãos,

Nesta solenidade queremos aprender da Virgem Assunta ao Céu rezar com ela: primeiro rezando por Maria, segundo rezando com Maria e terceiro rezando como Maria.

1. Rezar por Maria. Frequentemente, ouvimos a expressão: “rezar à Virgem Maria”… Esta maneira de falar não é absolutamente exata, porque a oração cristã dirige-se a Deus, ao Pai, ao Filho e ao Espírito: só Deus atende a oração. Os protestantes recordam-nos que Maria é e se diz ela própria a Serva do Senhor. Rezar por Maria é pedir que ela reze por nós: “Rogai por nós pecadores agora e na hora da nossa morte!” A sua intervenção

maternal em Caná resume bem a sua intercessão em nosso favor. Ela é nossa “advogada” e diz-nos: “Fazei tudo o que Ele vos disser!”

2. Rezar com Maria. A Virgem Maria está ao nosso lado para nos levar na oração, como uma mãe sustenta a palavra balbuciante do seu filho. Na glória de Deus, na qual nós a honramos hoje, ela prossegue a missão que Jesus lhe confiou sobre a Cruz: “Eis o teu Filho!” Rezar com Maria, mais que nos ajoelharmos diante dela, é ajoelhar-se ao seu lado para nos juntarmos à sua oração. Ela acompanha-nos e guia-nos na nossa caminhada junto de Deus.

3. Rezar como Maria. Aprendemos junto de Maria os caminhos da oração. Na escola daquela que “guardava e meditava no seu coração” os acontecimentos do nascimento e da infância de Jesus, nós meditamos o Evangelho e, à luz do Espírito Santo, avançamos nos caminhos da verdade. A nossa oração torna-se ação de graças no eco ao Magnificat. Pomos os nossos passos nos passos de Maria para dizer com ela na confiança: “que tudo seja feito segundo a tua Palavra, Senhor!”

Caros irmãos,

Nesta bendita solenidade da Assunção de Nossa Senhora aos céus podemos compreender que não somos uma alma aprisionada em um corpo. Este não constitui um empecilho para nossa plena realização como seres humanos destinados à comunhão com Deus. Ao contrário, na ressurreição, nossa corporeidade é resgatada e transfigurada no absoluto mistério de Deus. Assim, Maria, glorificada no céu em corpo e alma, é a imagem e o começo da Igreja e da humanidade do futuro, um sinal escatológico de esperança e consolo para o povo de Deus que caminha para a pátria definitiva. As pessoas que vivem uma consagração específica em um carisma explicitam esse sinal escatológico. Vivem no aquém as realidades do além, como ensina o dogma da Assunção de Maria.

O Santo Padre o Papa Francisco, pensando na Assunção de Maria, reza desta maneira: “Maria, a mãe que cuidou de Jesus, agora cuida com carinho e preocupação materna deste mundo ferido. Assim como chorou, com o coração trespassado, a morte de Jesus, assim também agora se compadece do sofrimento dos pobres crucificados e das criaturas deste mundo exterminadas pelo poder humano. Ela vive, com Jesus, completamente transfigurada, e todas as criaturas cantam sua beleza” (Laudato Si’, n. 241). Que seja assim nossa oração e que ela se torne ação e compromisso de fé e vida.

Irmãos queridos,

A vida de Nossa Senhora, a “serva” assemelha-se à do “servo”, Jesus, “exaltado” por Deus por causa de sua fidelidade até a morte. O amor torna semelhantes às pessoas. Também a glória. Em Maria, realiza-se, desde o fim de sua vida na terra, o que Paulo descreve na segunda leitura: a entrada dos que pertencem a Cristo na vida gloriosa do Pai, uma vez que o Filho venceu a morte e nos deu a vida eterna.

A comunhão com Deus nos faz lembrar hoje do exemplo da Virgem Maria que aprendeu a ler os acontecimentos e a perceber neles a ação de Deus libertando o seu povo. Percebeu-se, também, como parte importante nessa grande obra. Por isso invoquemos Maria como modelo do cristão que vai crescendo na sua resposta ao projeto de Salvação.

Santa Maria, rogai por nós. Amém!

Padre Wagner Augusto Portugal

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