Meus amados Irmãos,
Nesta solenidade de Pentecostes,
celebramos o grande mistério de nossa fé, onde a Paz anunciada pelo
Ressuscitado, ascenso ao céu, retorna ao Cenáculo para impor os dons do
Espírito Santo sobre os seus Apóstolos, na presença da Bem-aventurada Virgem
Maria, como havia prometido:
"Se me amais, guardareis os
meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Paráclito, para que
fique eternamente convosco. É o Espírito da Verdade, que o mundo não pode
receber, porque não o vê nem o conhece, mas vós o conhecereis, porque
permanecerá convosco e estará em vós. Não vos deixarei órfãos. Voltarei a
vós." (Jo 14,15-18).
A Solenidade de Pentecostes é,
pois, a plenificação do mistério pascal. A comunhão com o Ressuscitado só é
completa pelo dom do Espírito Santo, o “outro Paráclito”, que continua em nós a
obra do Cristo e a sua presença gloriosa.
A liturgia desta festa acentua
menos, no entanto, este lado teológico, insistindo mais na manifestação
histórica do Espírito Santo, no milagre de Pentecostes, conforme nos ensina a
Primeira Leitura (cf. At 2,1-11), e nos carismas da Igreja, de acordo com o
relato da Segunda Leitura (1 Cor 12,3b-7.12-13), sinais de unidade e de paz que
o Cristo veio trazer.
A Igreja, sacramento da unidade,
nos relembra que a pregação dos apóstolos, anunciando o Cristo Ressuscitado,
supera a divisão de raças e línguas e a diversidade de dons na Igreja serve
para a edificação do povo unido, o Corpo do qual Cristo é a cabeça.
Meus amigos,
Disse o Apóstolo dos Gentios que
“o amor de Deus se derramou em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi
dado” (Rom 5,5). Por isso, a celebração maior de Pentecostes, a manifestação de
Cristo Glorificado, é considerada a maior festa da Igreja, em comum união com a
festa da Páscoa.
Pentecostes é a festa da
plenitude dos tempos, predita pelos profetas. É a festa do início dos tempos da
Santa Igreja Católica, da nova e definitiva aliança, a que todos somos
convidados, a que todos somos vocacionados. É a festa da comunidade cristã, da
comunidade eclesial, da comunidade de fiéis, porque estas comunidades não
existem sem o Espírito Santo, que é a alma, que é a fonte de vida para a
Igreja. Pentecostes é a festa da unidade que dá o impulso apostólico da
pregação a todos os povos, para todas as línguas, para todas as nações. A fé
transcende os umbrais do povo hebreu, devendo ser anunciada a todos sem
distinção.
Com Pentecostes, em que o Senhor
desce na presença redentora do Cenáculo, os discípulos, inundados com os sete
dons do Espírito Santo, tornam-se APÓSTOLOS, ou seja, passam a ser enviados em
nome de Cristo, como Cristo, um dia, fora enviado em nome do Pai.
A presença da Bem-aventurada
Virgem Maria tem um significado muito especial: presente na Cruz, dada a João,
o discípulo amado, a sua presença no meio dos apóstolos a coloca como Mãe e
Mestra da Igreja de Cristo.
Ali em Pentecostes estava a
Igreja nascente, o Corpo Místico de Cristo. Por isso, os novos Apóstolos, hoje
batizados no Espírito Santo, correrão mundo afora, reunindo crentes e não
crentes, para criar comunidades, animá-las e santificar aqueles que aceitarem o
nome glorioso do Senhor Jesus.
Irmãos e irmãs,
A festa de Pentecostes nos pede
uma reflexão sobre a presença do Espírito Santo na história da salvação. Não
conhecido no Antigo Testamento, ou mesmo chamado de Deus desconhecido por Paulo
em Atenas, coube a Jesus revelar a existência de um Deus único e verdadeiro em
três pessoas distintas. É pelo Espírito Santo que se abrem os horizontes pelos
quais se movimentam e se compreendem todas as verdades da fé cristã.
O Espírito Santo é visível como o
próprio Cristo. Representado por símbolos como o vento, a pomba e as línguas de
fogo, elas não são uma espécie de encarnação do Espírito Santo, mas figuras que
nos ajudam a compreendê-lo em linguagem humana, o quanto é possível entendê-lo
e guardá-lo em nossos corações.
O Espírito Santo Paráclito. O que
é o Paráclito? Vem do grego que significa “aquele que vem para nos ajudar”. O
Espírito Santo pode ser considerado o nosso ADVOGADO, o nosso CONSOLADOR ou,
ainda, O ESPÍRITO DE VERDADE.
Orígenes disse que o Espírito
Santo é o beijo: o Pai beija, o Filho é beijado, o Espírito Santo é o beijo.
Uma figura bonita, assimilável ao homem moderno. Outros dizem que o Espírito
Santo é o abraço. O Pai abraça o Filho com todo amor. Esse amor é o Espírito
Santo. Ora, poderíamos dizer, a mãe abraça e beija o filho com todo o amor de
mãe, querendo dar-se inteiramente nesse beijo e abraço. Nem por isso consegue
dar-se totalmente.
O rosto do Espírito Santo tem
muitas maneiras de se mostrar. A mais significativa figura do rosto do Santo
Espírito é o AMOR, que se consubstancializa pela proteção que Ele dá aos
batizados e pelo auxílio de seus sete dons a todos os homens e mulheres para
sua santificação.
Irmãos caríssimos,
O Evangelho (cf. Jo 20,19-23)
mostra que a comunidade cristã só existe de forma consistente se está centrada
em Jesus. Jesus é a sua identidade e a sua razão de ser. É n’Ele que superamos
os nossos medos, as nossas incertezas, as nossas limitações, para partirmos à
aventura de testemunhar a vida nova do Homem Novo. Identificar-se como cristão
significa dar testemunho diante do mundo dos “sinais” que definem Jesus: a vida
dada, o amor partilhado.
As comunidades construídas à
volta de Jesus são animadas pelo Espírito. O Espírito é esse sopro de vida que
transforma o barro inerte numa imagem de Deus, que transforma o egoísmo em amor
partilhado, que transforma o orgulho em serviço simples e humilde. É Ele que
nos faz vencer os medos, superar as cobardias e fracassos, derrotar o ceticismo
e a desilusão, reencontrar a orientação, readquirir a audácia profética,
testemunhar o amor, sonhar com um mundo novo. É preciso ter consciência da
presença contínua do Espírito em nós e nas nossas comunidades e estar atentos
aos seus apelos, às suas indicações, aos seus questionamentos.
Prezados irmãos,
A primeira Leitura (cf. At
2,1-11) São Lucas coloca a experiência do Espírito no dia de Pentecostes. O
Pentecostes era uma festa judaica, celebrada cinquenta dias após a Páscoa.
Originariamente, era uma festa agrícola, na qual se agradecia a Deus a colheita
da cevada e do trigo; mas, no séc. I, tornou-se a festa histórica que celebrava
a aliança, o dom da Lei no Sinai e a constituição do Povo de Deus. Ao situar
neste dia o dom do Espírito, Lucas sugere que o Espírito é a lei da nova
aliança (pois é Ele que, no tempo da Igreja, dinamiza a vida dos crentes) e
que, por Ele, se constitui a nova comunidade do Povo de Deus – a comunidade
messiânica, que viverá da lei inscrita, pelo Espírito, no coração de cada
discípulo (cf. Ez 36,26-28).
Vem, depois, a narrativa da
manifestação do Espírito (At 2,2-4). O Espírito é apresentado como “a força de
Deus”, através de dois símbolos: o vento de tempestade e o fogo. São os
símbolos da revelação de Deus no Sinai, quando Deus deu ao Povo a Lei e constituiu
Israel como Povo de Deus (cf. Ex 19,16.18; Dt 4,36). Estes símbolos evocam a
força irresistível de Deus, que vem ao encontro do homem, comunica com o homem
e que, dando ao homem o Espírito, constitui a comunidade de Deus.
O Divino Espírito Santo (força de
Deus) é apresentado em forma de língua de fogo. A língua não é somente a
expressão da identidade cultural de um grupo humano, mas é também a maneira de
comunicar, de estabelecer laços duradouros entre as pessoas, de criar
comunidade. “Falar outras línguas” é criar relações, é a possibilidade de
superar o gueto, o egoísmo, a divisão, o racismo, a marginalização… Aqui, temos
o reverso de Babel (cf. Gn 11,1-9): lá, os homens escolheram o orgulho, a
ambição desmedida que conduziu à separação e ao desentendimento; aqui,
regressa-se à unidade, à relação, à construção de uma comunidade capaz do
diálogo, do entendimento, da comunicação. É o surgimento de uma humanidade
unida, não pela força, mas pela partilha da mesma experiência interior, fonte
de liberdade, de comun
hão, de paz.
As palavras de Pedro (cf. At
2,14-41) confirmam que a comunidade nascida deste Espírito é animada pelo
dinamismo da profecia. Sob o impulso do Espírito, a comunidade cristã está
chamada a continuar, no meio dos homens, a missão profética de Jesus. A sua missão
não é defender os próprios interesses, mas fazer ecoar no mundo a Palavra
libertadora de Deus. Sob o impulso do Espírito, a comunidade cristã é portadora
da Boa Nova que Deus dirige a cada pessoa e a cada nação: é enviada a libertar
os homens das cadeias que os escravizam, a conduzi-los no caminho de Deus, a
apresentar-lhes uma proposta de vida nova e de salvação.
A segunda Leitura (cf. 1 Cor
12,3b-7.12-13), mostra a comunidade de Corinto vivia numa grande agitação
carismática, fruto da presença do Espírito. Os carismas são dons que devem ser
postos ao serviço da comunidade, para a construção do Corpo de Cristo.
O Espírito é a alma, o dinamismo
interior da comunidade cristã. É Ele que convoca a comunidade e suscita, em
cada membro, dons que devem ser postos ao serviço da comunidade, para a
construção do Corpo de Cristo.
O Espírito Santo é o elo de
união, que une todos os membros da comunidade e os transforma no único Corpo de
Cristo. Na comunidade onde está presente e actua o Espírito, todos são
“unidos”, “irmãos”, membros de um mesmo corpo: os dons de cada um não são um
factor de divisão e de dispersão, mas de união e de construção comunitária.
Amados irmãos, estamos a celebrar
uma das festas mais importantes da nossa fé cristã: a Solenidade do Espírito
Santo, derramado abundantemente sobre cada um de nós. Que as luzes do Santo
Espírito iluminem o nosso caminho de fé e de amor, para que possamos seguir a
Jesus Ressuscitado e ser dignos das promessas de Cristo, anunciando e
partilhando a nossa fé. Amém.
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